A operação “chuta pombos” parece ser o pontapé inicial para
resolver o assunto mais evitado das duas últimas décadas. A cracolândia paulistana, pois que há as
paulistas, as nacionais e as internacionais, é o ponto de supuração de um abcesso
psicossocial que se alastra pelos subcutâneos das aparências metropolitanas.
Inicialmente era apenas uma celulite que denunciava os descuidos pessoais em
função de se manter o glamour de um status psicossocial: eu sou o que eu
tenho. Como a celulite não dava mais
para disfarçar, pois sempre, invariavelmente, em algum momento, havemos de
ficar desnudos diante nós mesmos, acabamos aceitando qualquer ideia ou atitude
que nos leve a um alívio imediato para esta angústia existencial. Esta é a porta de entrada paras as pequenas
corruptelas da vida: o medo da realidade.
Os predadores sociais de plantão fazem apenas o que a presa quer
oferecendo uma saída rápida e fácil para as “dores” do real tamanho. Aplicações “milagrosas” de substâncias
“detergentes” corrompem a proteção queratínica da pele e atingem o subcutâneo
causando um efeito imediato de satisfação pessoal por se recuperar a fantasia e
o glamour das aparências. Porém, como
tudo continua irreal, a agulha que rompe a pele trás também bactérias que
corrompem o subcutâneo iniciando um processo infeccioso sutil e insidioso que
culmina em abcessos que se lastram diante da indiferença e acabam supurando em
algum momento. Novamente, por hábitos
arraigados, se aceita as saídas rápidas e fáceis dos curativos de superfície, como
“band aids” sócio políticos de efeito apenas higiênico. A submissão ao curativo
é aparentemente feita por livre escolha e voluntária, mas é principalmente pela
desinformação que a aceitamos e por que “precisamos” continuar a “faturar” a
satisfação egóica. Neste cenário fantasioso é que permitimos que o abcesso se
alastre numa erisipela incontinenti de subterfúgios psicossociais aplicados sem
critérios, a esmo mesmo, enquanto o sol continua atravessando a peneira de
nossas consciências.
A pergunta a ser feita então é – o que fazer? De certo que não existe uma saída rápida e
fácil para a epidemia de dependência química seja de álcool, de drogas e/ou de
medicamentos. O que está claro é que se continuarmos fazendo as mesmas coisas
não podemos esperar resultados diferentes. Voltamos à era pré-Pasteur onde não
se acredita mais em bactérias e não se lava mais a mãos antes de comer – lavam-se
as mãos tal qual Pilatos, mas só depois que morder uma das fatias de um “bolo”
com ingredientes corruptos. Honestidade, mente aberta e boa vontade tornaram-se
valores éticos e morais que incomodam “o livre pensamento” e quando se fala
desses valores humanos básicos corre-se o risco de se estar saindo da curva
estatística da normalidade. E lembrando que a curva normal, conhecida também
como moda em estatística, contempla apenas o que mais acontece, mas não indica
o que é bom nem o que é belo e muito menos o que é verdadeiro. Cabe ao foro íntimo de cada um rever seus
hábitos, seus pensamentos e seus sentimentos e não mais se deixar levar pelas
ondas que a propaganda e o marketing propagam, seja boca a boca ou pelos meios
de comunicação de massa. Cabe aqui outra pergunta – onde então encontrar a
informação que me libertará dessas atitudes repetitivas e inconscientes? Várias são as fontes de informações e muitas
delas são até contraditórias, relembrando o método “Abelardo Barbosa” (o
Chacrinha) que não veio para explicar e sim para confundir. Com certeza algumas
ideias não se questionam mais apesar de já terem sido muito polêmicas, por
exemplo, na época de Oswaldo Cruz quando o Estado precisou intervir obrigando a
população a aceitar a vacinação tida como um desrespeito ao direito de escolha
do indivíduo.
Neste mundo contemporâneo,
a ideia do livre arbítrio é utilizada para induzir comportamentos de consumo, inclusive
e principalmente o de álcool e de outras drogas. Você decide “livremente” estudar, trabalhar e
juntar coisas e depois tem o direito a um “happy-hour” consumista. Porém só é realmente livre em suas decisões
aquele que está de posse e compreendendo todas as informações existentes sobre
um determinado assunto. E para isso necessitamos de tempo e de disposição
interna para não decidir ás pressas, tal qual ensina os manuais mais tacanhos
de compra e venda. E mesmo depois de obtermos todas as informações e ainda
ficarmos em dúvida? Neste caso cabe a regra de ouro dos investigadores e também
dos investidores: na dúvida, não faça nada e também não diga nada. Temos o direito de escolher livremente,
inclusive de admitirmos que não se tem uma opinião formada sobre qualquer
assunto . E se era para ter dito ou feito?
Haveremos apenas de arcar com as responsabilidades do atraso que é muito
mais justo e honesto do que tentar retirar o que já foi dito ou desfazer o que
já foi cometido.
Em suma – a aceitação do nosso real tamanho, buscando as
informações que nos auxiliem a estudar nossas dificuldades sem medo e sem
culpa, permitirá desenvolvermos o senso de responsabilidade pessoal e social.
Assim poderemos livremente não mais aceitar esse modelo de sofrimento como
desculpa para os alívios imediatos: será possível ter um “happy-day” no final
do qual nos sentiremos real(izados) e dispensaremos as fantasias e o glamour de
qualquer tipo de “droga”.